Em entrevista para a Varejo S.A., Cássio Mattos explica como o ESG pode ser uma boa estratégia para o negócio atrair clientes, reduzir custos e melhorar a eficiência
O nível de consciência da população em relação a temas socioambientais vem aumentando, e isso influencia as pessoas na hora de escolher o quê e de quem vão comprar. Segundo o PPI Brasil 2021 (Purpose Premium Index), feito pela InPress Porter Novelli em parceria com o Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (IBPAD), cerca de 90% dos consumidores confiam mais em uma empresa com propósito e 88% preferem comprar de marcas que defendem algo maior do que seus produtos e serviços. Além disso, autenticidade, ética, tratamento aos funcionários e proteção ao meio ambiente são os fatores ligados ao propósito que mais pesam na hora de escolher uma marca.
De olho neste filão, as empresas têm adotado o ESG – abreviação para Environmental, Social and Corporate Governance (Governança Ambiental, Social e Corporativa, em tradução livre) – como estratégia para se destacar no mercado. Hoje, já é uma tática adotada em todo o mundo. O E está ligado a questões ambientais, como adotar ações para reduzir o aquecimento global e a escassez de água. O S se relaciona às pessoas, de dentro e fora da empresa, ou seja, oferecer bom tratamento aos empregados e buscar a satisfação dos clientes são formas de cuidar da parte social. Já o G diz respeito aos cuidados de administração da empresa.
Segundo Cássio Mattos, diretor da RH Mattos, a pandemia acelerou o processo de adesão das empresas ao ESG. “O tema ESG acelerou de um ano para cá. Até então, os assuntos não eram vistos de uma forma integrada, e a governança, o ambiental e o social eram tratados separadamente. No último ano, isso ganhou maior relevância e passou a impactar mais as marcas. Não cuidar bem do social, tanto interno quanto externo, traz consequências para as empresas. Já se não cuidarem bem da governança, especialmente se forem tomadores de recursos, não terão credibilidade perante os agentes financeiros”, pontua Cássio Mattos.
Para entender melhor o ESG, a Varejo S.A. conversou com Cássio Mattos. Confira:
Quando essa preocupação com o ESG começou a chegar nas empresas?
O tema ESG acelerou de um ano para cá. Até então, os assuntos não eram vistos de uma forma integrada, e a governança, o ambiental e o social eram tratados separadamente. No último ano, isso ganhou maior relevância e passou a impactar mais as marcas. Não cuidar bem do social, tanto interno quanto externo, traz consequências para as empresas. Já se não cuidarem bem da governança, especialmente se forem tomadores de recursos, não terão credibilidade perante os agentes financeiros.
Agora, essas três preocupações juntas passam a direcionar a qualidade de gestão das empresas. Quando falo de qualidade de gestão, falo que esta sigla não pode ser letra morta no papel ou no discurso. Deve estar acompanhada de indicadores e, no final de cada exercício, ter demonstração da melhoria conseguida ou alcançada no tratamento desses indicadores.
(Imaginemos) empresas que causam resíduos em arroios ou rios. O quanto elas estão despejando durante 2021 e o quanto reduzirão esse impacto na natureza, no final do ano? Quanto se comprometem a baixar no ano de 2022?
Se não trabalhava com diversidade, mas agora tem indicadores (nesse sentido), é preciso mostrar (para os consumidores) o que está sendo praticado na empresa. Portanto, se tinha tantas mulheres, tantas pessoas por gênero e por opção sexual, deve-se medir essa evolução, o equilíbrio da dispersão dessas pessoas dentro da organização.
Na governança, se (antes) não tinha um conselho de administração, quando passa a ter, melhora a consistência de administração. É dessa maneira que o ESG vem para contribuir na gestão.
As empresas realmente têm essas preocupações ou é apenas marketing?
Tem uma questão de pano de fundo aí que é muito importante: primeiro que o ESG é um princípio. Estamos falando de comportamentos e atitudes a serem praticados. Por outro lado, não posso onerar a empresa e assustar o empresário com a imagem de que fazer isso gera custos elevados, baixa a produtividade e perde rentabilidade. Se eu quero ser uma empresa percebida como socialmente evoluída, uma empresa que respeita o meio ambiente, uma empresa que tem transparência nos seus controles financeiros, por exemplo, eu preciso ter isso como um princípio da minha vida. Isso tem que ser importante primeiro para o principal executivo da empresa. Se entender que para a vida dele é importante, fica mais fácil entender como praticar na sua organização. Ele precisa ter esse princípio, se não tiver, a gente vai ter aquelas empresas de greenwashing, ou seja, faz de conta que tem práticas de ESG, tem um discurso bonito, mas na realidade não consegue sustentar esse discurso.
Esse tripé é praticado de forma diferente pelas empresas?
Claro! Se eu pegar uma organização na área de serviço de Tecnologia da Informação, talvez seja uma empresa que tenha melhores condições de trabalhar o seu social e a sua governança e um baixo impacto no meio ambiente. Se trabalhar com uma empresa do ramo industrial, que tem uma estação de tratamento de afluentes, estará fortemente conectada com o meio ambiente, e também com o social e a governança.
Esse equilíbrio de dedicação e intensidade e de acompanhamento das questões do ESG pelas empresas, depende um pouco sim da natureza, do segmento e do ramo de atividade. Mas, como eu disse anteriormente, é essencial que o principal líder da organização – o presidente, o fundador, um presidente profissional ou um executivo cliente de mercado – tenha isso dentro de si para sua vida.
É necessário um investimento alto? É acessível para todas as empresas? Basta querer fazer?
Basta querer, não é preciso investimento alto. Já tem muito sendo praticado dentro das empresas, por mais conservadoras e tradicionais que possam ser. Há muitas questões relacionadas ao ESG que já estão dentro da empresa, e a partir delas é possível buscar a evolução e a melhoria. É preciso desmistificar que o ESG anda em paralelo com a empresa. O ESG é o planejamento da empresa.
Na prática, a empresa precisa se perguntar: como vou tratar meus clientes no aspecto social? Como vou trabalhar as minhas relações com os meus fornecedores e funcionários? Como vou trabalhar os indicadores, os demonstrativos financeiros e os demonstrativos de resultados? Como vou trabalhar uma relação de transparência com os acionistas majoritários e minoritários?
Todas essas respostas já estão lá dentro da empresa. É só uma reorganização dentro do princípio e acertar uma conduta alinhada a isso.
O investimento é desculpa para não fazer ou desconhecimento do que é o ESG como estratégia. Se o empreendedor conhece e entende que o ESG é o planejamento estratégico da empresa, vai ver que não tem como não fazer. Vai fazer um plano estratégico para o exercício do próximo ano, ou para os próximos dois ou três anos.
O ESG pode dar errado?
Qualquer coisa malfeita pode dar errado. Em qualquer organização, é preciso consistência, método, disciplina e vigilância. É essencial acompanhar continuamente as melhorias. Os líderes também devem ter olhos muito atentos, para que esses projetos não fracassem.
Qual o impacto da chegada do ESG para o varejo?
Olha, a Gazin, loja de departamento que tem sede no Paraná, é hoje uma referência, um benchmarking da importância da aplicação do ESG e do ganho de produtividade. Eles estão conseguindo negociações muito atrativas e interessantes com o Santander, se não me falha a memória, a partir dos indicadores de redução de consumo de energia nas suas lojas. À medida que estão trabalhando com energia limpa e avançando com a governança e os indicadores sociais, estão conseguindo reduções bem atrativas na captação de recursos.
Você acredita que existe uma certa pressão para que o ESG seja aceito?
Não! As empresas mais organizadas, que possuem um conselho de administração e estão fazendo a implementação estratégica dos princípios do ESG, serão exemplos e inspirarão negócios menores, que poderão ver como é um vetor essencial para alcançar resultados.
O ESG vai ser algo natural daqui algum tempo?
Para aquelas empresas que tem planejamento estratégico, sim. Para aquelas que deixam a vida levar, não. O ESG é a estratégia! Portanto, só será efetivo para os empreendimentos que traçam e implementam suas estratégias, monitoram os seus resultados e fazem planos de melhoria.
*Estagiário sob supervisão de Fernanda Peregrino, editora da Varejo S.A.
Fonte: VAREJO S.A.
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